Ao analisar a cultura e a ideologia , vários autores procuram demonstrar que não se podem utilizar esses dois conceitos separadamente, pois há uma profunda relação entre eles , sobretudo no diz respeito ao processo de dominação nas sociedade capitalistas. O pensador italiano Gramsci (1891-1937) analisa essa questão com base no conceito de hegemonia (palavra de origem grega que significa "supremacia" , "preponderância") e no que ele chama de aparelhos de hegemonia. Por hegemonia pode-se entender o processo pelo qual uma classe dominante consegue fazer que o seu projeto seja aceito pelos dominados , desarticulando a visão de mundo autônoma de cada grupo potencialmente adversário. Isso é feito por meio dos aparelhos de hegemonia, que são práticas intelectuais e organizações no interior do Estado ou fora dele (livros , jornais , escolas, música , teatro , etc.) . Nesse sentido , cada relação de hegemonia é sempre pedagógica , pois envolve uma prática de convencimento , de ensino e aprendizagem. Para Gramsci, uma classe se torna hegemonia quando , além do poder coercitivo e policial, utiliza a persuasão , o consenso , que é desenvolvido mediante um sistema de ideias muito bem elaborado por intelectuais a serviço do poder , para convencer a maioria das pessoas , até as das classes dominadas. Por esse processo , cria-se uma "cultura dominante efetiva" , que deve penetrar no sendo comum de um povo , com o objetivo de demonstrar que a forma como aquele que dominava o mundo é a única possível. A ideologia não é o lugar da ilusão e da manifestação , mas o espaço da dominação, que não se estabelece somente com o uso legítimo da força pelo Estado , mas também pela direção moral e intelectual da sociedade como um todo , utilizando os elementos culturais de cada povo. Mas Gramsci aponta também a possibilidade de haver um processo de contra-hegemonia , desenvolvido por intelectuais orgânicos , vinculados à classe trabalhadora, na defesa de seus interesses. Contrapondo-se à inclucação dos ideais burgueses por meio da escola , dos meios de comunicação de massa, etc., eles combatem nessas frentes , defendendo outra forma de "pensar, agir e sentir" na sociedade em que vivem. O sociólogo francês Pierre Bourdieu desenvolveu o conceito de violência simbólica para identificar formas culturais que impõem e fazem que aceitemos como normal , como verdade que sempre existiu e não pode ser questionada, um conjunto de regras não escritas nem ditas. Ele usa a palavra grega doxa (que significa "opinião") para designar esse tipo de pensamento e prática social estável , tradicional, em que o poder aparece como natural. Dessa ideia nasce o que Bordieu define como naturalização da história, condição em que os fatos sociais, independentemente de ser bons ou ruins , passam por naturais e tornam-se uma "verdade" para todos. Um exemplo evidente é a dominação masculina , vista em nossa sociedade como algo "natural" , já que as mulheres são "naturalmente" mais fracas e sensíveis e , portanto, devem se submeter aos homens. E todos aceitam essa ideia e dizem que "isso foi , é e será sempre assim". Bourdieu declara que é pela cultura que os dominantes garantem o controle ideológico , desenvolvendo uma prática cuja finalidade é manter o distanciamento entre as classes sociais. Assim, existem práticas sociais e culturais que distinguem que é de uma classe ou de outra : os "cultos" têm conhecimentos científicos , artísticos e literários que os opõem aos "incultos" . Isso é resultado de uma imposição cultural (violência simbólica) que define o que é ter "cultura". A violência simbólica ocorre de modo claro no processo educacional. Quando entramos na escola , em seus diversos níveis , devemos obedecer sempre a um conjunto de regras e absorver um conjunto de saberes predeterminados , aceitos como o que se deve ensinar. Essas regras e esses saberes não são questionados e normalmente não se pergunta quem os definiu. Theodor Adorno (1903-1969) e Max Horkheimer (1895-1973) , pensadores alemães, procuraram analisar a relação entre cultura e ideologia com base no conceito de indústria cultural . Apresentaram esse conceito em 1947 , no texto "A Indústria Cultural : O Esclarecimento Como Mistificação das Massas. Nele , afirmavam que o conceito de indústria cultural, permitia explicar o fenômeno da exploração comercial e a vulgarização da cultura , como também a ideologia da dominação. A preocupação básica era com a emergência de empresas interessadas na produção em massa de bens culturais , como qualquer mercadoria (roupas, automóveis , sabonetes, etc.) , visando exclusivamente ao consumo , tendo como fundamentos a lucratividade e a adesão incondicional ao sistema dominante. Adorno e Horkheimer apontaram a possibilidade de homogeneização das pessoas , grupos e classes sociais ; esse processo atingiria todas as classes , que seriam seduzidas pela indústria cultural , pois esta coloca a felicidade imediatamente nas mãos dos consumidores mediante a compra de alguma mercadoria ou produto cultural. Cria-se assim uma subjetividade uniforme e, por isso, massificada. Os mais diversos filmes de ação , somos tranquilizados com a promessa de que o vilão terá um castigo merecido. Tanto nos sucessos musicais quanto nos filmes , a vida parece dizer que tem sempre as mesmas tonalidades e que devemos nos habituar a seguir os compassos previamente marcados. Dessa forma, sentimo-nos integrados numa sociedade imaginária, sem conflitos e sem desigualdades. A diversão, nesse sentido , é sempre alienante , conduz à resignação e em nenhum momento nos intiga a refletir sobre a sociedade em que vivemos. A indústria cultural transforma as atividades de lazer em um prolongamento do trabalho, promete ao trabalhador uma fuga do cotidiano e lhe oferece , de maneira ilusória , esse mesmo cotidiano como paraíso. Por meio da sedução e do convencimento , a industria cultural vende produtos que devem agradar ao público , não para fazê-lo pensar com informações novas que o perturbem, mas para propiciar-lhe uma fuga da realidade. Tal fuga, segundo Adorno , faz que o indivíduo se aliene, para poder continuar aceitando com um "tudo bem" a exploração do sistema capitalista.